AS DUAS CAIXAS
“O corpo
carrega duas caixas. Na mão direita, mão da destreza e do poder, ele leva uma
caixa de ferramentas. E na mão esquerda, mão do coração e do prazer, ele leva
uma caixa de brinquedos.”
“Os animais
não precisam de ferramentas. Seus corpos são as ferramentas de que necessitam
para viver. Diferente dos animais, nossos corpos são fracos e incompetentes. Se
fôssemos depender deles para sobreviver, como os animais, há muito teríamos
desaparecido da Terra. A fraqueza e a incompetência obrigaram o corpo a pensar
e a criar. E foi assim que inventamos porretes, pilões, facas, flechas, redes,
barcos, casas, escolas, como extensão do corpo.”
“A primeira
tarefa de cada geração, dos pais e das escolas, é passar aos filhos como
herança, a caixa de ferramentas. Para que eles sobrevivam e não tenham de
começar da estaca zero.”
“Diante da
caixa de ferramentas, a primeira pergunta que um professor tem de fazer é: “Isto
que estou ensinando é ferramenta para quê? De que forma esse conhecimento
aumenta a competência de meus alunos para viver a sua vida?”
Mas há uma
outra caixa, na mão esquerda, a mão do coração e do prazer. Essa caixa está
cheia de coisas inúteis que não serve para nada. Lá estão um livro de poemas de
Cecília Meireles, a história de “Alice no País das Maravilhas”, um pé de
jasmim, um quadro de Monet, uma sonata de Mozart, um banho de cachoeira, um
beijo... Coisas inúteis. E, no entanto, elas são partes da vida e nos fazem
sorrir. E não é para isso que se educa? Para que saibamos, além de viver,
sorrir e ter prazer?
Resumo da
minha filosofia da educação:
Primeiro: aprender
ferramenta para ter poder.
Segundo:
aprender os brinquedos para ter prazer.
Rubem Alves
Folha de São Paulo – 27/04/2010
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